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Planejamento, a alma do negócio

A gestão do fluxo de caixa, complementa, é crucial para o crescimento da empresa.

Autor: Rejane TamotoFonte: Diário do ComércioTags: empresariais
A sócia da oficina Bidu Escapamentos, Carla Cristina Sudo Kai, de 31 anos, já se viu perdida na "linha do tempo" do caixa da empresa, já que 60% de suas vendas eram recebidas em um prazo mais longo do que aquele que ela tinha para pagar o fornecedor. "A maioria dos meus recebimentos estava programada para 30, 60 e 90 dias, ou seja, nós aceitávamos o pagamento em três prestações de qualquer cliente, independentemente do valor. E o fornecedor só me dava, no máximo, 45 dias para pagar pelas peças automotivas", conta. 
 
A situação que Carla viveu está  longe de ser uma novidade entre os pequenos e médios empresários, principalmente os comerciantes. Em geral, há uma falta de conciliação do contas a pagar e do contas a receber porque muitos empreendedores não fazem o devido registro de ocorrências do dia a dia da empresa, seja do que gerou em vendas, ou de compras que realizou e serviços que contratou, segundo o consultor financeiro do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP), Wagner Viana Pereira. 
 
"É preciso manter um registro diário, por meio de fichas, planilhas ou software. Para isso, é preciso organização e disciplina. Ao fazer isso de forma sistemática, o empresário conseguirá ter uma projeção do que vai gerar de caixa nos meses seguintes e visualizar, com antecedência, os momentos em que pode sobrar ou faltar dinheiro no caixa", explica. 
Segundo Pereira, a vantagem disso é perceber com antecedência se vai faltar dinheiro para pagar um fornecedor e já ligar para renegociar prazos. "Isso onera menos a empresa do que pegar, na última hora, empréstimo e usar o cheque especial", completa. A gestão do fluxo de caixa, complementa, é crucial para o crescimento da empresa.
 
Prazos – A falta de conciliação de prazos de recebimentos e de pagamentos não é uma característica de empresas que estão há pouco tempo no mercado. Com mais de 35 anos, a oficina de Carla começou a ter problemas com isto no final de dezembro de 2011, quando o movimento caiu e faltou dinheiro em caixa para pagar o décimo-terceiro dos funcionários. Carla, então, usou uma reserva financeira e antecipou recebíveis, depois de fazer uma pesquisa de taxas com bancos e credenciadoras. "Tivemos sorte de nunca precisar entrar na linha de capital de giro dos bancos. Mas mesmo assim, naquela época, não sabia como ajustar o prazo de receber e de pagar", diz. Ao buscar ajuda no próprio Sebrae-SP, Carla foi encaminhada para palestras e cursos e, depois de oito meses, conseguiu ajustar os prazos do caixa, mas com mudanças nas regras de seu estabelecimento. "Hoje, estimulo o cliente a pagar à vista com um desconto de 5% a 10% e só parcelo em três vezes se o valor for superior a R$ 600, o que permite que eu consiga um prazo maior para pagar ao fornecedor. Se ficar no meio desse valor, peço um cheque à vista e outro pré-datado em 45 dias. Pensei que teria problemas, mas aceitação dos clientes foi boa", conta. 
 
Linha do tempo – O segundo passo, explica a empreendedora, foi montar uma "linha do tempo do dinheiro". E depois padronizar a forma de colocar as informações em um software de controle. O próximo passo, diz a empresária, é concluir uma pesquisa com os fornecedores e sentar com cada um deles para renegociar os prazos e condições. "Se já consegui melhorar a área de contas a receber, com certeza um ajuste do prazo dos pagamentos vai melhorar muito o planejamento do caixa", afirma. Um resultado já foi visível em dezembro do ano passado quando, novamente, o movimento diminuiu na oficina. "Eu estava mais preparada. Antes nem sabia o que precisava pagar e receber, mas hoje consigo prever o caixa de um ou dois meses", conta. 
 
Pereira, consultor do Sebrae-SP, lembra que depois de organizar a parte operacional, com registros atualizados, organização e disciplina, o empresário pode fazer uma gestão  do ciclo operacional que possibilite visualizar o futuro do caixa. "É a parte mais estratégica, na qual deve ser feita a gestão de todo o ciclo, desde a compra de uma mercadoria e insumos de matéria-prima. O empreendedor monitora, então, o prazo médio de estocagem do produto até a venda ao consumidor. Depois da venda, ele saberá qual o prazo médio de recebimento e com os fornecedores, o prazo médio de pagamento. Ele vai saber exatamente as diferenças de prazos de recebimento e pagamento e qual o gap em que precisará de capital de giro. Quanto mais encurtar o prazo de recebimento e alongar o de pagamento, menor será esse gap", diz o consultor. 
 
Capital de giro – O sócio-líder da operação da Grant Thornton e colaborador da organização não-governamental Endeavor, Paulo Dortas, lembra que o maior ativo do empreendedor hoje é a gestão adequada do caixa, no qual é possível prever e administrar o capital de giro. "O ciclo da compra de uma mercadoria, venda e pagamento de fornecedores pode levar de 90 a 120 dias, dependendo da área de atuação. Neste intervalo, já foram mais de três a quatro folhas de pagamento e de aluguéis do imóvel. Quando um empreendedor inicia um negócio terá de ter uma reserva para cobrir os gastos do ciclo inicial, entre o produzir, comercializar, receber e pagar", afirma. 
 
Uma dica, segundo Dortas, é planejar pagamentos duas vezes por mês, tentando encaixar o recebimento com o pagamento. "O ideal é que o pagamento fique em uma data bem próxima e seguido da data de recebimento. É preciso explicar o ciclo todo ao fornecedor, para que ele entenda como funciona a empresa e participe do fluxo", aconselha Paulo Dortas.
 
Um método para organizar o ciclo de vendas
 
Uma outra forma de controle que deveria caminhar junto com a gestão do fluxo de caixa é o ciclo de vendas, também conhecido como funil ou pipeline. Trata-se de um método que elenca todas as tarefas que o vendedor vai executar para ter o processo de venda adequado, desde a prospecção, envio de proposta, negociação e fechamento da venda e o pós-venda. 
 
"Na etapa do fechamento da venda é que deve ser negociado um prazo compatível com a empresa, e obviamente com a necessidade do cliente, para não interferir negativamente no caixa. 
 
O pipeline é muito usado por empresas de serviços, nos quais a venda tem um ciclo longo, e é por isso que é preciso negociar um porcentual pago antecipadamente e outro em prazo determinado",  diz o consultor financeiro do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP), Wagner Viana Pereira. Também pode se adequar as empresas de equipamentos, softwares, publicidade e até imobiliárias.
 
De acordo com o diretor de marketing do Instituto Brasileiro de Inteligência de Mercado (Ibramerc), Henrique Gasperoni, o pipeline é importante para que a empresa perceba para quem ela perde o cliente, se para um concorrente ou substituto. "A principal diferença entre empresas grandes e pequenas é a utilização de tecnologia. As grandes investem em processo de acompanhamento por meio de CRM (Customer Relationship Management). Uma pequena pode fazer o controle em um caderno ou em planilha eletrônica", diz.
 
Histórico – O pipeline é um método baseado no histórico de vendas, a partir do qual se faz a projeção de probabilidade de fechar um negócio para o próximo mês. 
 
Segundo pesquisa realizada pela entidade, 52% dos profissionais de marketing de 200 empresas olham para o pipeline para desenvolver campanhas e ações voltadas para as vendas. Desse total, apenas 13% realizam uma análise detalhada do funil de vendas, enquanto 48% dos entrevistados fazem análises históricas rápidas ou atuam por percepção. 
 
O gerente geral nas operações de vendas da SalesWays no Brasil, Enio Klein, afirma que a atribuição de probabilidades de vendas nas etapas do funil não é uma unanimidade. "Pode subir ou descer em cada estágio, de acordo com as técnicas do vendedor. O processo não é estático e o vendedor precisa saber até onde pode dar descontos e abrir prazos", acrescenta ele.
 
Em empresas em que o pipeline é realizado é necessário haver uma conectividade com o departamento financeiro, que vai cuidar do fluxo de caixa, na opinião do sócio-líder da operação da Grant Thornton e colaborador da organização não-governamental Endeavor, Paulo Dortas. "Ambos devem estar em sintonia, para que o período do ciclo de venda gere recurso num prazo adequado à tesouraria."

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